Mulheres cartunistas conquistam espaço

Autor:
Redação

Seção:
Memória

Publicado em:
8 de Março de 2022

Tempo de leitura:
4 minutos

Mulheres cartunistas conquistam espaço

Por: Redação

Aquele que se propor a estudar a história da caricatura no Brasil irá notar que a presença feminina é um tanto limitada. Desde o surgimento dos jornais impressos no país no século XIX até meados do século XX, época em que atuaram grandes desenhistas, praticamente apenas duas mulheres se destacaram; Nair de Teffé (assinava Rian) e Hilde Weber, cada uma delas representando uma fase da imprensa e um período histórico específico.

RIAN

Nair de Teffé von Hoonholtz nasceu na aristocracia brasileira na cidade de Petrópolis em 10 de junho de 1886, filha do Barão de Teffé -- almirante considerado herói no Império por ter lutado na Guerra do Paraguai e que serviu a República como embaixador -- teve a formação  típica das moças de sua classe social; educada na França frequentou curso de pintura e sofreu influência de artistas franceses.

Como caricaturista, usava o pseudônimo de Rian, publicou alguns trabalhos em revistas parisienses e, ao voltar ao Rio de Janeiro, nas revistas ilustradas da época como Fon-Fon, O Malho e Careta, entre outras. Herman Lima, em sua História da caricatura brasileira, afirma que a trajetória da artista se deu de 1908 a 1913 e, depois deste período, surgiram apenas algumas publicações esporádicas até, pelo menos os anos de 1950. A despeito desta trajetória relativamente curta, Nair de Teffé é tida como a primeira cartunista brasileira e uma das pioneiras de sua arte no mundo.

Em dezembro de 1913 Nair de Teffé, aos 27 anos, casa-se com o presidente da República, Marechal Hermes da Fonseca então com 58 anos (cujo mandato vai de 1910 a 1914). Se após o casamento a carreira artística diminui a figura pública cresce com a abertura dos salões do Palácio do Catete para a música popular brasileira com Chiquinha Gonzaga e Catulo da Paixão Cearense.

Fica viúva em 1923 e se muda para Petrópolis onde continua se envolvendo na vida cultural e política da cidade atuando como diretora e atriz de teatro (criou a Troupe Rian). Em 1932 volta ao Rio de Janeiro e abre o Cine Rian que, no entanto, não obtém sucesso e se estabelece definitivamente em Niterói onde vive relativamente reclusa. Faleceu em 1981, aos 95 anos no mesmo dia em nasceu, 10 de junho.

HILDE WEBER

Alemã natural de Waldau, onde nasceu em 9 de setembro de 1913, chega ao Brasil em 1933 com um diploma da Academia de Artes Visuais de Hamburgo na bagagem. Suas primeiras ilustrações apareceram em jornais da Alemanha e, ao chegar ao Brasil passa a figurara esporadicamente nas publicações dos Diários Associados ate iniciar a colaboração fixa com charges políticas para a Tribuna da Imprensa em 1950. Em 1962 muda-se para São Paulo e passa a trabalhar no jornal O Estado de S. Paulo, onde permaneceu até 1989. Faleceu aos 81 anos em 13 de dezembro 1994.

A grande contribuição de Hilde para as artes brasileira é, sem dúvida, sua obra gráfica, o traço moderno e limpo que caracterizou suas charges, mas a artista também atuou em outros campos artísticos; estuda pintura com Bruno Giorgi e se torna próxima dos pintores do Grupo Santa Helena (Francisco Rebolo, Mario Zanini Alfredo Volpi e outros), realiza cerâmica, pintura de azulejo, desenha cenário para o teatro (Baile dos ladrões) e participa de cinco edições da Bienal Internacional de São Paulo (da primeira até a quarta e da sexta).

Hilde, apesar da longa carreira no humor gráfico e do respeito alcançado publicou apenas um livro de charges em vida; Brasil em Charges 1950-1985, pela Circo Editorial e recebeu o prêmio Seção América Latina do Concurso de Caricaturas do World Newspaper Forum  em 1960.

Muitos consideram Hilde a primeira chargista mulher da imprensa brasileira, ignorando o pioneirismo de Nair de Teffé, mas o fato é que as duas representam momentos distintos da história do jornalismo (e do humor gráfico). Enquanto a primeira atuou em um período onde os jornais brasileiros eram influenciados pela imprensa francesa de caráter mais literário e muitas vezes militante - tanto que o pai da jovem Rian só a autorizou a publicar seus trabalhos se não recebesse nada por isto. Hilde viveu a fase de profissionalização da imprensa  com os jornais adotando o modelo americano de publicar prioritariamente os fatos ficando a opinião como complemento da informação.

Polêmicas à parte, Nair de Teffé e Hilde são as mais importantes mulheres da história da caricatura brasileira e pioneiras que abriram o campo para as que estão hoje atuando tanto na charge quanto nas histórias em quadrinhos. Sem falar da importância de Cecilia Whitaker Vicente de Azevedo Alves Pinto, mais conhecida como Ciça, que a partir dos anos de 1970 publica a tira O Pato na Folha de S. Paulo e faz a ponte entre aquelas pioneiras e as artistas que surgiram a partir da década de 1980 e geração atual.

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Este texto foi escrito a partir de pesquisa elaborada por Guto Camargo e é a primeira publicação de uma série sobre as mulheres cartunistas que a Revista Pirralha está preparando.