Autor:
Redação
Seção:
Ponto de vista
Publicado em:
3 de Janeiro de 2022
Tempo de leitura:
3 minutos
Cartunistas: humor de esquerda e de direita!
Por: Redação
Por: Cláudio de Oliveira
Há uma visão de que a maioria dos cartunistas é de esquerda. E que os de direita são ruins.
É preciso estabelecer de qual esquerda estamos a falar. Vou dar um exemplo d’além mar para não ferir sensibilidades brasileiras.
Em Portugal, o gajo ou a rapariga poderá escolher entre três fortes e legítimos partidos situados no vasto campo da esquerda.
Há o mais forte deles, o Partido Socialista, do atual primeiro-ministro António Costa, que é um partido social-democrata, de centro-esquerda, filiado à Aliança Progressista, a qual também são filiados os brasileiros PT e PSB.
Há o mais antigo partido da esquerda portuguesa, que é o Partido Comunista Português, um partido muito ligado à ortodoxia marxista-leninista.
E ainda há o Bloco de Esquerda, um agrupamento de diferentes correntes de esquerda, que não são sociais-democratas nem se alinham à dogmática do PCP.
Pessoalmente, hoje me identifico mais com a social-democracia.
Se eu fosse cidadão cubano, provavelmente seria dissidente exilado em Madrid, vizinho de Pablo Milanés. E, faria críticas ao regime da ilha de Fidel, parafraseando o escritor José Saramago, que declarou em 2003, a propósito do fuzilamento de três cidadãos de Cuba que tentavam fugir para Miami em uma lancha:
“Até aqui cheguei. De agora em diante, Cuba segue seu caminho e eu fico onde estou. Cuba não ganhou nenhuma heroica batalha fuzilando esses três homens, mas sim perdeu minha confiança, fraudou minhas esperanças, destruiu minhas ilusões. Até aqui cheguei.”
Não queria estar na pele de um cartunista do jornal soviético Krokodil, que só podia criticar aspectos secundários da União Soviética, mas não a sua essência autoritária.
Há bons chargistas de direita, como o francês Jacques Faizant, que durante muito tempo publicou na Le Point. Mas de qual direita estamos a falar? Liberais como Angela Merkel, Ulysses Guimarães e Tancredo Neves absolutamente nada têm a ver com protofascistas como Jair Bolsonaro e Donald Trump.
Se eu tivesse de escolher, ficaria com Plantu, que foi chargista do Le Monde, um jornal sempre próximo do Partido Socialista Francês. Apesar disso, Plantu não deixou de fazer a crítica do governo do presidente François Miterrand. Plantu cumpriu seu papel de chargista. Ele mais contribuiu para o processo político fazendo o livre debate do que se se subordinasse a um partido ou a um poder.
A meu ver, o humor deve ser sempre contestatório e não conformista. Deve exercitar sempre a crítica.
KROKODIL – A principal revista satírica soviética. Surgida em 4 de junho de1922 como suplemento dominical do jornal Rabochii (O Trabalhador) se tornou independente devido ao sucesso obtido. Foi publicada até 2008 e sua circulação chegou a ser de 5,8 milhões (em 1980). Durante o período soviético seu humor foi dirigido principalmente contra o imperialismo ocidental e à ideologia burguesa. O símbolo da publicação era um crocodilo vermelho carregando um forcado.
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Cláudio de Oliveira - Jornalista pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte com especialização em artes gráficas na Escola Superior de Artes Aplicadas de Praga, República Tcheca (1989-1992). Publica charges desde1976 em diversos jornais, em 1993 torna-se chargista da Folha da Tarde e, a partir de 1999, do Agora São Paulo. Ganhou o Prêmio Vladimir Herzog dos Direitos Humanos de 1996 (arte); o Troféu HQ Mix de 1999 (melhor livro de charges) e a Medalha Angelo Agostini em 2020 (melhor chargista de SP). É autor de diversos livros e e-books de humor e ensaios políticos, entre eles Lenin, Martov, a Revolução Russa e o Brasil e Era uma vez em Praga - Um brasileiro na Revolução de Veludo.
Este texto foi publicado originalmente no Facebook do autor - https://www.facebook.com/chargistaclaudio/