Entram em cenas as cartunistas brasileiras

Autor:
Redação

Seção:
Memória

Publicado em:
9 de Março de 2022

Tempo de leitura:
10 minutos

Entram em cenas as cartunistas brasileiras

Por: Redação

Continuando a serie comemorativa ao Dia Internacional da Mulher a Revista Pirralha apresenta a segunda parte do levantamento sobre as desenhistas que fizeram história no mundo do cartum, caricatura, charge e quadrinhos brasileiros na imprensa do século XX. A primeira parte deste levantamento traz uma pequena biografia das artistas  Nair de Teffé (Rian) e Hild Weber (veja AQUI).  Conheçam agora outras pioneiras do traço que fizeram história.

CAHÚ

Maria da Conceição de Souza Cahú nasceu em 1951 em Floresta do Navio, Pernambuco e morreu no dia 18 de dezembro de 2006 de câncer aos 62 anos em Recife cidade onde estudou pintura na Escola de Belas Artes e publicou seus primeiros trabalhos. No entanto, sua carreira como ilustradora, chargista, cartunista e caricaturista se deu em São Paulo para onde se mudou em 1975; durante sua passagem pela cidade publicou nos jornais Brasil Mulher, O Estado de S. Paulo, “Folha de S. Paulo, Jornal da Tarde, Diário Comércio e Indústria; nas revistas Cláudia, Playboy, Capricho, Visão, Editora Companhia das Letras e outras revistas e jornais,  mas seu nome acabou ligado ao jornal Gazeta Mercantil onde atuou por quase 30 anos até o final melancólico do diário que decretou falência em 2001. O jornal especializado na cobertura econômica não utilizava fotos em suas páginas o que permitiu a Cahú se especializar na técnica do retrato a "bico de pena" que a fez famosa. Cahú ganhou, em 1992, o 21º Salão de Humor de Piracicaba na categoria Quadrinhos com “Uma História de Amor”, uma Homenagem a Carlos Zéfiro (a ilustração deste artigo é um autorretrato da artista). 

CIÇA

Cecilia Whitaker Vicente de Azevedo Alves Pinto, jornalista, escritora e cartunista paulistana nascida em 2 de maio de 1939 é a mais importante quadrinhista mulher da geração que se formou profissionalmente após o golpe militar de 1964 atuando nos jornais alternativos e na grande imprensa. Ciça é a criadora da tira diária O Pato, que foi publicada pelo jornal Folha de S. Paulo ininterruptamente ao longo de 18 anos, iniciada em 1967  teve sua última aparição em 21 de novembro de 1985 (O Pato também foi veiculado no Jornal do Brasil e na Folha da Manhã). Após a experiência com os quadrinhos a autora se voltou para a produção de livros infanto juvenis. É casada com  o chargista Zélio Alves Pinto, com quem fez parcerias artísticas  em várias oportunidades e ganhou o 21º Troféu HQ Mix na categoria "Grande Mestre" em 2009.

CRAU

Crau França publicou seus primeiros cartuns na revista O Bicho, editada por Fortuna que teve nove edições entre janeiro de 1975 e novembro de 1976. Nas décadas seguintes colaborou eventualmente em veículos regionais no Litoral Norte SP, região onde reside e passou a adotar o nome de Crau da Ilha. Em 2014 editou o livro-revista As Periquitas, primeira reunindo cartunistas e quadrinistas mulheres de vários lugares do Brasil; em 2016 foi o destaque na mesa de debate sobre as presursoras do quadrinho no 2º  Encontro Lady’s Comics realizado em Belo Horizonte nos dias 29,30 e 31 de julho. Formada em Engenharia de Aquicultura e Tecnologia em Produção Multimídia  fez Mestrado em Aquicultura, recebeu o Troféu da AQC como Mestra do Quadrinho Nacional no 36.º Prêmio Angelo Agostini em 2019 e atualmente é do conselho editorial da revista Pirralha.

GISELDA MELO

Em 1944 é publicada a primeira HQ de Giselda Melo na revista O Tico-Tico (nº 1.904), em 1946 ela cria a raposa  Pechincha que aparece na revista até 1957. Durante a década de 1940 ela colabora em outra revista infantil (Cirandinha) e ilustra o livro Ler e Brincar. Durante os anos de 1950 não se tem notícias sobre nenhuma atividade artística de Giselda Melo, segundo o site HQ retrô, ela teria se tornado professora e retorna ao mundo do entretenimento cultural em 1964 quando passa a apresentar o Teatrinho Peteleco na TV-Rio. Segundo o mesmo site ela teria nascido em 1909 mas a data do seu  falecimento é desconhecida (foto reproduzida da revista Radiolândia nº 131, 1956 - obtida no site HQ retrô).

HELENA FONSECA  F. JORGE

Roteirista de quadrinhos desde a década de 1960 de histórias de terror e de heróis para as editora Outubro e Taika passou a atuar na editora Abril nas revistas Disney, sendo uma das primeiras mulheres a se profissionalizar na área. A roteirista  foi agraciada em 1995 com o Prêmio Angelo Agostini e a escola municipal Judith Lintz, de Leopoldina (MG) homenageia a roteirista dando seu nome a gibiteca, que surgiu como um blog em 2007, que passa a se chamar Gibiteca Escolar Helena Fonseca a partir de 2017 por ocasião das comemorações dos seus dez anos.

MARIA APARECIDA GODOY

Nascida em Guaratinguetá, no interior paulista, desde criança ouvia no rádio ou narrado por moradores simples do Vale do Paraíba onde morava as populares histórias de assombração. A partir deste material passou a escrever contos de terror que enviava às editoras na esperança de publicá-las. Em 1968 um destes textos cai em mãos de Rodolfo Zalla que passa a encomendar roteiros para quadrinhos de terror então em moda. Cida Godoy, como assinava seus textos, tem uma fase bastante produtiva que dura até o fechamento das revistas Calafrio e Mestres do Terror em 1993. Homenageada com o Troféu Angelo Agostini em 1997, se afasta das HQs e atua no movimento negro, principalmente na Pastoral Afro da Paróquia N.Sra. Achiropita no bairro do Bixiga (Bela Vista) em São Paulo, reduto do samba paulista.

MARIZA DIAS COSTA

Filha do diplomata Mário Dias Costa, a artista nasceu na Guatemala em 1952, morou em diversos países, tornou-se poliglota e a ilustradora mais importante da imprensa brasileira. Apesar de ter trabalhado em muitos jornais e revistas, tanto alternativos quanto na grande imprensa desde o meados dos anos de 1970, atuado nos mais diversos gêneros (inclusive quadrinhos), Mariza ficou conhecida como ilustradora, principalmente na Folha de S. Paulo. A artista desenvolveu  uma técnica onde misturava desenho, colagem e texturas obtidas em imagens xerocadas, que ela mesma chamava de "Marizatone". Seu desenho típico e pessoal se tornou uma espécie de marca registrada das colunas escritas por Paulo Francis (com quem começou uma parceria em 1978 que durou até sua morte em 1997)  e Contardo Calligaris. Mariza foi acometida de um mal súbito quando na noite do dia 28 de março de 2019 caminhava pela ruas do bairro onde morava, socorrida, faleceu no hospital mas a causa da sua morte não foi divulgada. Em fevereiro de 2014 lançou o livro ...E depois a maluca sou eu! reunindo suas ilustrações (foto reproduzida a partir do vídeo de divulgação do livro).

NEIDE HARUE

Nascida em 1956 na cidade de Presidente Prudente (SP), foi muito influenciada pelo estilo característico do mangá e fez carreira como desenhista de quadrinhos a partir de 1986 e durante a década de 1990 em São Paulo. Sua obra mais conhecida é Drácula, A Sombra da Noite, trabalho feito em parceria com seu marido, o roteirista Ataíde Braz, a série foi publicada em 5 edições totalizando mais de 300 páginas pela editora Nova Sampa. O casal também publicou o livro Vamos aprender a desenhar mangá e a artista foi tema de um livro da coleção Sketch Book da editora Criativo. Após este período de atuação a artista abandonou o desenho e voltou a morar no interior, mas é lembrada como uma das pioneiras dos mangás brasileiros (Foto: desenho que ilustra a capa do Scetch Book da autora).

PAGU

Patrícia Rehder Galvão, a Pagu, foi uma das mais importantes personalidades do movimento modernista de São Paulo mesmo não tendo participado da Semana de Arte Moderna de 1922 pois há época contava com apenas 12 anos (nasceu em 9 de junho de 1910). Ao completar 18 anos, em 1928, se aproxima do grupo liderado por Oswald de Andrade que publicava a Revista de Antropofagia onde publica seus primeiros desenhos. Na década de 1930 Pagu e Oswald de Andrade, com quem havia se casado, ingressam no Partido Comunista e fundam o jornal O Homem do Povo onde são publicadas suas tiras de quadrinhos. Devido a sua posição política o casal enfrentou vários problemas durante o governo Vargas, o que lhe rendeu a primazia de ter sido a primeira mulher a ser presa política no século XX. Durante a década de 1950 ela, então casada com o jornalista Geraldo Ferraz, passa a morar na cidade de Santos, litoral Paulista, onde continua sua carreira de jornalista e militante na área cultural, principalmente no teatro. A artista morreu de câncer em 12 de dezembro de 1962.

YOLANDA PONGETTI

Nascida em Petrópolis, Yolanda na infância estudou música, canto e artes e em 1935 passa a integrar a redação da revista Espelho onde desenha capas, vinhetas e principalmente caricaturas (portaits-charges) de personalidades da época, além de ilustrar vários livros. Apesar dos elogios que recebeu por seu trabalho, abandonou o desenho profissional e na década seguinte iniciou carreira como tradutora de francês na revista Vamos Ler! Em 1950 passa a viver em Roma onde é a responsável pelo Escritório de Propaganda e Expansão Comercial do Brasil e pelas revistas e boletins da entidade e esporadicamente produz novas caricaturas. Faleceu na Itália em 4 de janeiro de 1954.

YVETE KO MOTOMURA

Mais conhecida como artista plástica, Ivete, filha de imigrantes japoneses, nasceu em São Paulo em 1945 e atuou como ilustradora na Folhinha de S. Paulo, caderno infantil do jornal e é a única artista mulher que figura no livro Mestres da Ilustração: a técnica da ilustração, capas e cartazes, de Jayme Cortez (1970). Como artista plástica participou de dezenas de exposições, com destaque para a  IX Bienal de São Paulo em 1967, X Bienal Internacional de São Paulo, expôs seus desenhos no Museu de Arte de São Paulo (MASP) - Ivete Ko: Desenhos Recentes - em 1987 (foto: desenho da artista que ilustra a capa de livro Vidas falsas de Grace Metalious publicado em 1967).

YOLANDA  STORNI

Yolanda Storni é filha do desenhista Alfredo Storni (4/11/1881 - 20/03/1966) e irmã de Oswaldo Storni (25/05/1909 - 10/09/1972), sendo que os três chegaram a trabalhar juntos em O Tico-Tico nos anos de 1930. A artista criou as séries  Papá e Pupú publicada no número 1.680, de dezembro de 1937 e Aventuras de Paulino. Apesar da importância da família no campo da ilustração e dos quadrinhos não há muita informação disponível sobre a carreira de Yolanda.

ARTOBELA e IRENE

As duas artistas, segundo Herman Lima em História da Caricatura no Brasil, "tiveram uma existência pública verdadeiramente meteórica", tendo publicado apenas no início dos anos de 1940 na revista Diretrizes. Um fato curioso é que Artobela era irmã do desenhista Roberto Rodrigues e do escritor Nelson Rodrigues, ao passo que Irene era irmã do cartunista Nássara; esta situação, ao mesmo tempo que lhe garantiam contato no meio jornalístico, pode ter sido, ao lado do ambiente estritamente masculino das redações da época, o motivo que tornaram suas carreiras tão breves, apesar de Herman Lima considerá-las de "aguda expressão pessoal" e "promissoras".

GISELDA GUIMARÃES GOMES e REGINA

Nas páginas de O Tico-Tico pode-se observar a existência de HQs assinadas por mais duas mulheres; Giselda Guimarães Gomes  e outra que assina simplesmente Regina. Sobre elas  praticamente não existem outras informações que ajudem a traçar uma biografia mais detalhada. Giselda  atuou em revistas infantis durante a década de 1950, além de O Tico Tico, publicou em Pinguinho (editada de 1954 a 1958)  e Tiquinho (1950 a 1963), sendo, portanto, ambas também precursoras na publicação de quadrinhos no Brasil,

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Este levantamento foi feito inicialmente para a revista As Periquitas por Cristina Merlo, professora universitária e pesquisadora de quadrinhos, revisto e ampliada por Guto Camargo para ser republicada na Revista Pirralha. Caso os leitores observem algum erro ou omissão podem entrar em contato pelo email contato@revistapirralha.com.br.