O papel do chargista nos dias que correm

Autor:
Colaboradores

Seção:
Ponto de vista

Publicado em:
29 de Abril de 2024

Tempo de leitura:
3 minutos

A chargista Crau analisa a importância da charge no momento político atual

O papel do chargista nos dias que correm

Por: Colaboradores

Texto: Crau -  Maria Cláudia (*)

O papel de chargista hoje está mais necessário do que nunca. Entre tantas narrativas que querem parecer verdades – mas sempre suscitam dúvidas a espíritos mais livres – o chargista preparado entra com seu lampião para aclarar as coisas. Quase que visceralmente o leitor, que já ouviu as diversas narrativas, é apanhado por aquela imagem instantânea que traduz um sentimento mais íntimo e então exclama: “é isso mesmo!” A ideia transborda do desenho como uma luz que, ao ser acesa, dissipa a escuridão que reina no mundo das versões distorcidas.

A charge torna explíciito os culpados e as vítimas; a tarefa do humor é desmascarar a hipocrisia. Uma charge fina, cortante como lâmina, pode ser um antídoto contra memes causadores de confusão. Quando uma situação de opressão é insuportável o chargista pode levar ao limite o absurdo da ocasião apontando as causas do problema ou alertando para suas consequências por isso as charges, muitas vezes, são carregadas de sarcasmo, de indignação. Portanto o humor funciona como uma lente de aumento.

Mas tripudiar sobre quem já sofre não é charge, é molestamento, é perseguição pois estes são indefesos.

Charge quer dizer carga e por isto se afirma que não há chargista de direita, que não há charge a favor. A charge sempre há de explicitar uma situação sobre a qual nem tudo foi dito. Uma boa dose de consciência social ou de classe ajuda, mas não basta, a interpretação dos fatos pelo chargista passa pelo filtro da sua própria consciência e por um trabalho contínuo de informação em várias fontes e por discernir a qualidade da informação.

O chargista tem de se preparar para sê-lo e conhecer o traço e a postura de quem mais fez pela profissão. Tem de tomar o partido de quem está indefeso, de quem quer viver num mundo mais justo, mais solidário. É que a charge vem para trazer verdades dantes ocultas a fim de que outros possam modificar a realidade para melhor. Já disse o querido e lendário Nani, ser chargista é ser uma espécie de pregador sem púlpito.

Sob o jugo do dominador a charge floresce como resistência à dominação. Quando existe autocrítica e boa vontade uma charge pode mesmo transformar, alertar, afiar o discernimento e a consciência. Neste momento o chargista percebe que conseguiu comunicar a visão que não lhe é imposta. Talvez não chegue a derrubar governos, mas pode ajudar os governantes presentes e futuros a pensar. A esperança maior de todo chargista é que o algoz veja a charge, caia em si e se retrate.

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(*) Crau da Ilha (uma vez que mora em Ilhabela) é também a Crau do Bicho pois seu trabalho foi apresentado na revista o Bicho nos anos 1975-77.Trabalhou com charges em jornais locais do litoral de São Paul Fundou e editou a revista As Periquitas, com colaborações das mais importantes cartunistas mulheres.