Tem início a jornada do herói nos quadrinhos

Autor:
Guto Camargo

Seção:
Quadrinhos

Publicado em:
22 de Abril de 2024

Tempo de leitura:
6 minutos

Wash Tubbs, o personagem que deixou o humor de lado e introduziu as aventuras e os heróis nas histórias em quadrinhos

Tem início a jornada do herói nos quadrinhos

Por: Guto Camargo

Até os anos de 1920 os quadrinhos (como o próprio nome em inglês – comics – demonstra) eram basicamente histórias cômicas publicadas nos jornais em tiras diárias em geral com três ou quatro quadros ou nos suplementos de final de semana ocupando uma página inteira e impressa em cores. A coisa começou a mudar quando Roy Crane apresentou em 14 de abril de 1924 o pequeno Wash Tubbs (Tubinho no Brasil), o personagem se chamava Washington Tubbs II mas logo teve o nome abreviado para Wash. Inicialmente tratava-se de uma tira cômica clássica com desenho cartunesco que não tinham continuidade e a piada se resolvia no mesmo dia.

A primeira aparição de Wash Tubbs quando ainda trabalhava em uma mercearia e não havia iniciado suas aventuras

Nas primeiras histórias o herói estava mais preocupado em se relacionar com belas mulheres, principalmente a filha do patrão da mercearia onde trabalhava, do que em busca de aventuras, mas poucas semanas depois Roy Crane faz o personagem abandonar a mercearia e ele parte para viajar pelo mundo em divertidas aventuras que agora se desenrolam em sequência deixando de apresentar uma piada isolada.

A partir de então Roy Crane constrói os enredos cada vez com mais de ação. O problema é que Whash era baixinho e nada atlético, o que não fazia dele um típico aventureiro. Se por um lado isto garantia os aspectos cômicos da trama criava algumas limitações pelo lado dramático e o autor resolveu a situação introduzindo parceiros mais viris para contracenar com a estrela da tira.

Nos anos seguintes Wash Tubbs ganhou diferentes amigos bons de briga até que em 6 de maio de 1929 surge o Capitão César (Captain Easy), o novo personagem assume com o tempo o papel de protagonista passando o atrapalhado Tubbs a ser o coadjuvante, principalmente nas páginas dominicais que é publicada com o título de Capitão Easy - Soldado da Fortuna (iniciada em 11 de junho de 1933), onde Crane podia desenvolver melhor o enredo. Nesta altura, a HQ já era definitivamente um quadrinho de aventuras protagonizado por um clássico personagem heroico.

O centenário dos heróis

A transição que Roy Crane empreendeu do humor para a aventura (o que não ocorreu com Popeye que também era um aventureiro introduzido em uma tira cômica) serviu de abertura para o surgimento dos quadrinhos de heróis; Tarzan (um personagem que veio da literatura para as HQs) e Buck Rogers (início da ficção científica nas HQs) concomitantemente em janeiro de 1929 e o Fantasma (primeiro mascarado dos gibis) são outras pequenas revoluções nas abordagem das tiras que ajudaram a moldar a multidão de heróis que invadiriam as histórias em quadrinhos ao longo da década de 1930: o detetive Dick Tracy em outubro de 1931, Flash Gordon (1934), Jim das Selvas (1934), Agente Secreto X-9 (1934), Terry e os Piratas (1934), Mandrake (1934), Príncipe Valente (1937) e a lista se prolonga com muitos outros nomes menos lembrados que marcaram a cultura popular dos gibis no mundo todo.

Portanto, se tomarmos a data da criação de Wash Tubbs como referência estamos agora comemorando o centenário do surgimento dos quadrinhos de aventuras que, por sua vez, encerra a década com outra novidade; o surgimento em 1938 do Superman, que abre o capítulo dos superpoderosos heróis com força e poder sobre-humanos que inaugura um novo estilo de quadrinhos, estes criados diretamente para os gibis.

Capitão César, o primeiro grande herói de aventura nos quadrinhos

Dos jornais para os gibis

A esta altura o mercado de quadrinhos esta amadurecido e controlado pelos Syndicates que distribuem os heróis norte-americanos mundo afora. Deste quadro resulta uma espécie de subproduto que são as republicações das tiras dos jornais em revistas baratas. Em julho de 1934 surge nas bancas o que pode ser considerado como o precursor dos gibis; o tabloide Famous Fannies, da Dell Publishing, editora especializada em revistas populares (pulps). A editora cria um departamento, a Dell Comics, que se associa a Western Publishing para produzir gibis com títulos licenciados dos estúdios de animação como Warner, Metro e principalmente Disney.

Não demorou muito e novas editoras também começam a criar publicações com as histórias em quadrinhos com destaque para a fundação em 1935 da National Publications (futura DC Comics) e em 1939 da Timely Comics (precursora da Marvel), que se tornariam as maiores editoras de gibis de super-heróis do planeta.

Outra prova da força da indústria de quadrinhos surgida neste período foi sua aproximação com o cinema. Em 1934, é lançado pela Universal, em 12 episódios, o primeiro seriado baseado em uma HQ; Tolspim Tommy in the great air mystery. No Brasil Tolspim Tommy, uma história sobre pilotos de aviões criação da dupla Glenn Chaffin (roteiro) e Hal Forrest (arte), era publicado no Suplemento Juvenil. Depois disto os quadrinhos viraram matéria-prima para a cinematografia e atualmente, com as duas principais editoras do ramo de super-heróis, DC e Marvel, pertencendo aos estúdios os super-heróis praticamente se tornaram apêndice da indústria cinematográfica.

Artista aventureiro

Royston Campbell Crane (foto ao lado) nasceu em 22 de novembro de1901 em Adilene (Texas) e desde jovem mostrou interesse pelo desenho chegando a fazer um curso por correspondência antes de estudar na Academia de Belas Artes de Chicago. Roy Crane tinha um espírito aventureiro, o que certamente o motivou a trocar as piadas de Wash pelos perigos do Capitão César. No início da década de 1920, após abandonar o curso de arte em Chicago ele volta para casa de carona nos vagões de trens e depois viaja em um navio cargueiro para a Europa.

Em 1922 ele se estabelece em Nova York e começa a trabalhar no departamento de arte no New York World, jornal de Joseph Pulitzer. Tentando publicar, sem muito sucesso, suas criações Crane acaba por oferecer seu trabalho para a Newspaper Enterprise Association (NEA) e eis que a sorte lhe sorri; o diretor da NEA, Charles N. Landon, era também diretor do curso por correspondência que o jovem artista fizera na adolescência, o que lhe garante a oportunidade de publicar Washington Tubbs II e deslanchar sua carreira.

No entanto, os direitos sobre Whash Tubbs e o Capitão César pertenciam a NEA e ele resolve abandonar a distribuidora para se dedicar a uma nova criação agora para o King Features Syndicate. Nesta época, para conquistar as melhores tiras, Hearst além de um bom salário garantia aos artistas a posse dos direitos autorais, assim, em novembro de 1943 Crane passa a publicar o aventureiro Buzz Sawyer, um piloto da marinha que luta na II Guerra Mundial.

Roy Crane morre em 7 de julho de 1977 reconhecido como um dos grandes quadrinhistas dos EUA.